Introdução
Um gesto que atravessou séculos
Leia abaixo os versículos que narram a história da mulher do perfume:
36 E rogou-lhe um dos fariseus que comesse com ele; e, entrando em casa do fariseu, assentou-se à mesa.
37 E eis que uma mulher na cidade, que era uma pecadora, sabendo que ele estava à mesa em casa do fariseu, levou um vaso de alabastro com unguento;
38 E, estando por detrás, aos seus pés, chorando, começou a regar seus pés com lágrimas, e os enxugava com os cabelos da sua cabeça; e beijava seus pés, e os ungia com o unguento.
39 Quando isto viu o fariseu que o tinha convidado, falava consigo, dizendo: Se este fosse profeta, bem saberia quem e qual é a mulher que lhe toca, pois é uma pecadora.
40 E respondendo, Jesus disse-lhe: Simão, uma coisa tenho a dizer-te. E ele disse: Dize-a, Mestre.
41 Um certo credor tinha dois devedores: um devia-lhe quinhentos dinheiros, e outro cinquenta.
42 E, não tendo eles com que pagar, perdoou-lhes a ambos. Dize, pois, qual deles o amará mais?
43 E Simão, respondendo, disse: Tenho para mim que é aquele a quem mais perdoou. E ele lhe disse: Julgaste bem.
44 E, voltando-se para a mulher, disse a Simão: Vês tu esta mulher? Entrei em tua casa, e não me deste água para meus pés; mas esta regou meus pés com lágrimas, e os enxugou com os cabelos de sua cabeça.
45 Não me deste ósculo, mas esta, desde que entrou, não tem cessado de me beijar os pés.
46 Não me ungiste a cabeça com óleo, mas esta ungiu meus pés com unguento.
47 Por isso te digo que os seus muitos pecados lhe são perdoados, porque muito amou; mas aquele a quem pouco é perdoado pouco ama.
48 E disse a ela: Os teus pecados te são perdoados.
49 E os que estavam à mesa começaram a dizer entre si: Quem é este, que até perdoa pecados?
50 E disse à mulher: A tua fé te salvou; vai-te em paz.
Entre tantas histórias comoventes dos Evangelhos, há uma que brilha por sua delicadeza, profundidade e redenção: a da mulher que ungiu os pés de Jesus com perfume, narrada em Lucas 7.36-50. Trata-se de um momento íntimo e corajoso, que nos revela não apenas o coração de uma mulher anônima, mas também a natureza do perdão divino e o poder transformador do amor.
Este artigo sobre a mulher do perfume se propõe a ir além da narrativa. Vamos mergulhar no contexto histórico, refletir sobre os simbolismos e aplicações espirituais, e descobrir como essa mulher – que não tem nome, mas cuja atitude ecoa até hoje – representa a essência do arrependimento, da gratidão e da fé.
O contexto cultural e religioso da época
A mulher marginalizada e os códigos de pureza
Na sociedade judaica do primeiro século, uma mulher rotulada como “pecadora” vivia à margem da vida comunitária. O termo provavelmente se referia a uma mulher de conduta moral reprovável – talvez prostituta, embora o texto não afirme explicitamente. Seu lugar social era de vergonha, invisibilidade e rejeição.
Ela vivia sob a sombra de um sistema religioso que classificava pessoas entre “puros” e “impuros”. A religião havia se tornado, para muitos, um fardo de regras, e não uma ponte para Deus. Nesse cenário, essa mulher rompe barreiras ao entrar na casa de Simão, um fariseu – grupo religioso rigoroso e defensor da Lei.
O que ela faz é revolucionário para sua época: se aproxima de um homem (Jesus), em público, comovida, chora, toca Seus pés e os unge com um perfume caro. Cada gesto dessa mulher do perfume era um desafio às convenções, mas ela não se detém. O que a move não é ousadia social, mas quebrantamento espiritual.
A simbologia do perfume: amor, entrega e redenção
Um vaso quebrado, uma alma rendida
O perfume usado por essa mulher não era qualquer essência. Era algo valioso – talvez o bem mais precioso que possuía. O texto sugere que ela trouxe “um vaso de alabastro com unguento”. O alabastro era um material usado para guardar substâncias finas, e o unguento, provavelmente nardo puro, era caríssimo.
Esse gesto carrega significados profundos:
- Entrega total: Ela não guarda nada para si. Não há reservas. Não há metades. Sua vida, simbolicamente, é derramada aos pés de Jesus.
- Arrependimento genuíno: Suas lágrimas lavam os pés do Mestre. Chorar na presença de Deus é, muitas vezes, mais eloquente do que mil palavras.
- Amor sacrificial: O perfume não é apenas um presente, mas um símbolo do valor que ela atribui a Jesus. É um gesto de adoração pura.
Enquanto Simão a julga por seu passado, Jesus olha para o seu coração. Ali, no chão da sala, com lágrimas e perfume, ocorre uma transformação que palavras humanas não conseguiriam expressar.
O contraste entre o fariseu e a pecadora
Quando a religiosidade é cega e o amor é luz
Lucas constrói intencionalmente um contraste entre dois personagens: Simão, o fariseu, e a mulher do perfume, uma pecadora. Simão recebe Jesus com frieza: não O beija, não Lhe lava os pés, nem Lhe unge a cabeça com óleo – gestos comuns de hospitalidade naquela cultura.
Já a mulher, sem dizer uma palavra, faz tudo isso com intensidade e humildade. Jesus, então, conta uma parábola curta, mas impactante (Lucas 7.41-43), sobre dois devedores que tiveram suas dívidas perdoadas. A pergunta que Ele faz é incisiva: “Qual deles o amará mais?”
Essa cena revela que:
- A religiosidade sem amor é estéreo.
- O julgamento moral alheio muitas vezes esconde o orgulho espiritual.
- Jesus vê além das aparências. Ele vê o íntimo do ser.
O amor da mulher é resposta ao perdão que ela já sentiu em sua alma. Ela não veio pedir. Ela veio agradecer. Sua fé antecedeu a salvação declarada por Jesus: “Tua fé te salvou; vai-te em paz.”
A força espiritual do arrependimento verdadeiro
Lágrimas que lavam mais do que os pés
Arrependimento não é um sentimento de culpa. É uma transformação interior. A mulher do perfume nos mostra como é o arrependimento genuíno: não busca desculpas, não tenta se justificar. Ela se lança aos pés de Jesus com tudo o que é, e ali encontra algo que o mundo jamais pôde oferecer – perdão e aceitação.
Essa história da mulher do perfume nos lembra que:
- Nenhum pecado é maior do que a graça de Deus.
- Jesus não é repelido por nossos erros, mas atraído pela sinceridade do coração.
- O quebrantamento abre espaço para a cura.
Enquanto a sociedade via seus pecados, Jesus viu sua fé. Enquanto os outros sentiam vergonha de sua presença, Ele a defendeu publicamente. Aquela mulher, tida como “imprópria”, foi honrada por Jesus de maneira que poucos homens haviam sido.
Aplicações para a mulher cristã hoje
Ser como a mulher do perfume em um mundo de julgamentos
A história da mulher do perfume continua viva. Ela ecoa em nossas vidas, em nossos altares pessoais, em nossos momentos de intimidade com Deus. Ser como ela é ter coragem de se apresentar diante de Cristo tal como somos, com nossas falhas, dores e esperanças.
Para a mulher cristã hoje, essa narrativa oferece:
- Inspiração para uma vida de adoração autêntica: Não precisamos de reconhecimento humano. Nosso perfume deve ser derramado aos pés de Jesus.
- Modelo de humildade e rendição: Ela não defendeu sua história. Simplesmente se ajoelhou.
- Convite ao amor corajoso: Um amor que não teme julgamentos, que rompe barreiras e que se expressa com gestos simples, mas profundos.
Vivemos dias em que a aparência importa mais que essência. A mulher de Lucas 7 nos lembra que Deus se importa com o coração. Seu gesto simples e profundo ainda perfuma a história do Evangelho.
Conclusão: Uma história que ainda exala perfume

Lucas 7 não é apenas um relato antigo preservado nas páginas das Escrituras. É uma revelação viva do caráter de Cristo e da resposta que Ele espera de um coração quebrantado. A mulher sem nome, com sua coragem silenciosa e amor escandaloso, atravessa os séculos como um símbolo da graça que transforma e do amor que não mede consequências.
Ela não disse uma palavra, mas sua atitude falou alto. Ela não tinha status, mas conquistou a atenção de Jesus. Não trazia riquezas, mas ofereceu o que tinha de mais precioso: um coração arrependido e um perfume derramado em adoração. Enquanto os fariseus julgavam e os olhares a condenavam, o olhar de Cristo a redimia. E isso mudou tudo.
Jesus não apenas a defendeu diante dos religiosos. Ele selou seu destino eterno com palavras que ecoam até hoje: “Os seus muitos pecados lhe foram perdoados, pois ela muito amou.” A mulher do perfume foi envolvida por um amor que vê além da aparência, que cura feridas antigas e ressignifica histórias marcadas pela dor.
Sua história ainda inspira — e desafia — cada mulher que deseja viver com autenticidade diante de Deus. Ela nos convida a deixar para trás os medos, as máscaras e as reservas, para nos lançarmos completamente aos pés do Salvador. Nos chama a uma vida onde o amor não é apenas falado, mas demonstrado com gestos concretos de entrega, serviço e adoração.
Que o perfume daquela entrega ainda nos envolva. Que nossa espiritualidade seja marcada por essa mesma ousadia amorosa, por uma fé que se ajoelha, que chora, que adora. E que a nossa vida, como a dela, continue deixando rastro de perfume — não apenas pelo que fazemos, mas por quem escolhemos ser aos pés de Jesus.
Que artigo maravilhoso! A história da mulher do perfume sempre me tocou profundamente, e você conseguiu trazer todos os detalhes e significados dessa passagem de forma tão bonita. A forma como você abordou o arrependimento verdadeiro, a entrega total e o contraste entre a mulher e o fariseu foi incrível. Realmente uma lição de humildade, fé e gratidão. Me fez refletir muito sobre a forma como a gente se aproxima de Deus e se entrega com amor. Parabéns pelo texto, muito inspirador!
Que coisa linda! Fico feliz que tenha gostado.